sábado, 19 de fevereiro de 2011

Ensaio sobre o futuro

É noite mas não se vê muitas estrelas. As nuvens grossas dividem-se ao sabor do vento, ocupando a cada instante o lindo céu que há ali, escondido.

A todo o entardecer, Anna, 12 anos, sai de seu trabalho suja de carvão mineiral (o vegetal já não mais existe) e senta-se na varanda de sua modesta casa feita de pedras toscas e desencontradas, a um sopro de desabar. Fica ali sentada, olhos fixos no céu, esperando uma oportunidade de poder vislumbrar algum brilho lá em cima. Talvez Sírius Prime ou Marte. Uma vez, quando tinha sete, conseguiu ver toda a constelação de Andrômeda. Fora o dia mais emocionante de sua vida e também a última vez que chorara até hoje. Toda vez que percebe uma estrela, seus olhinhos marrons piscam, como uma máquina fotográfica, tentando gravar os momentos raros. Em sua cabeça tinha todo o mapa estelar desenhado, as estrelas que já vira antes circuladas de rosa.

Ela era uma apaixonada. Uma das mais velhas em sua mina, no pequeno intervalo de cinco minutos só falava do espaço e das luzes que, na verdade, eram maiores que nosso planeta, mas que parecem tão pequenas que dão a impressão de serem glitter que pode ser guardado no bolso para ser visto quando se quiser. Mas não é assim e ela sabe disso.

Mas essa noite é diferente. Por um fugidio instante ela viu uma grande luz, maior do que todas as outras, tão forte que ardeu-lhe os olhos.

Era a primeira vez na vida que Anna via a lua.

Sua boca abriu-se em um pequeno "o" e seus olhinhos piscaram furiosamente. É claro que ela sabia que a lua existia, sabia que os ricos que antes viviam em seu planeta haviam ido para lá, para a primeira colônia da Terra, quando o Tratado Gamma determinou que a situação da biosfera terrestre era irreversível. O tratado que determinou a vida de milhões de pessoas, principalmente as pobres como ela. Um paraíso. Um paraíso nunca antes visto por ela, apenas imaginado. Ocupando sua superfície luminosa, ela podia ver sombras longas, os prédios maiores que as minas que ela cavava com as próprias mãos. Um lugar de felicidade.

Ficou imaginando se mais alguém via aquilo. Depois pensou se alguém na lua conseguia ver aquela grande bola cinza que era a Terra. Será que eles pensavam como era horrível viver ali? Como era triste ter de cavar e cavar sem nunca usurfruir daquilo que tirava das rochas? Será que eles sabiam que se continuassem assim, a lua ficaria exatamente como a Terra? Será que eles sabiam, desde o começo, que antes, muito antes, havia uma chance de uma vida digna para todos? Claro que sabiam. Só não ligavam.

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